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Pesquisa da UFPB revela relação entre traços de personalidade e comportamento de beber e dirigir

publicado: 30/09/2025 13h50, última modificação: 30/09/2025 13h50
Estudo analisa influência de traços de personalidade em infrações, acidentes e no comportamento de dirigir após consumir álcool

Pesquisa da UFPB revela relação entre traços de personalidade e comportamento de beber e dirigir

Por que algumas pessoas, mesmo cientes dos perigos e das leis rigorosas, ainda insistem em dirigir após consumir álcool? Essa foi a questão que norteou um estudo conduzido por pesquisadores do Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social (PPGPS) da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), em colaboração com instituições nacionais e internacionais. A investigação buscou compreender de que forma diferentes características de personalidade influenciam comportamentos de risco no trânsito, como dirigir alcoolizado, cometer infrações e se envolver em acidentes.

Os autores do estudo são os pesquisadores Renan Monteiro, Carlos Eduardo Pimentel e Phillip Dyamond Gomes da Silva, vinculados ao PPGPS da UFPB, em colaboração com os professores Thiago Marques de Brito e Gabriel Lins de Holanda Coelho da University College Cork, Irlanda.

Os pesquisadores partiram de um dado preocupante: apesar da fiscalização e da legislação brasileira serem severas, os índices de acidentes relacionados ao consumo de álcool permanecem elevados. Nesse cenário, a psicologia surge como aliada estratégica para identificar fatores individuais que predispõem motoristas a tais comportamentos, permitindo desenvolver políticas públicas e intervenções mais direcionadas.

O estudo revelou que traços como busca de sensações, psicopatia e extroversão aumentam significativamente a probabilidade de dirigir após beber. Motoristas com altos níveis de busca de sensações, por exemplo, tendem a ver o trânsito como espaço para experiências estimulantes, o que leva a excesso de velocidade, distrações e maior número de multas e acidentes. Já a extroversão, ligada ao gosto por festas e interações sociais, mostrou associação com maior exposição ao consumo de álcool e, consequentemente, ao risco de beber e dirigir. O traço de psicopatia também se destacou, relacionado à irresponsabilidade, à quebra de normas e à baixa sensibilidade às punições legais.

Em contrapartida, a abertura a experiências se mostrou um fator protetivo, pois pessoas com esse perfil tendem a reconhecer os riscos sociais e pessoais do beber e dirigir, reduzindo as chances de cometer infrações ou de se envolver em acidentes.

Um resultado inesperado foi a impulsividade não se mostrar preditora relevante para dirigir sob efeito de álcool, apesar de ser um dos traços considerados pela Resolução nº 01/2019 do Conselho Federal de Psicologia, que regula a perícia psicológica no trânsito. Esse achado reforça a necessidade de evidências empíricas mais robustas para fundamentar políticas e avaliações no setor.

Segundo o pesquisador Renan Monteiro, a pesquisa traz evidências empíricas sobre um amplo conjunto de traços de personalidade e suas relações com comportamentos de risco no trânsito. 

“Esses resultados podem estimular novas investigações e permitir que as avaliações psicológicas foque nos traços que representam maior risco. Além disso, uma avaliação cada vez mais embasada em dados científicos é fundamental para decisões mais consistentes no contexto da obtenção e renovação da CNH. Considerando a estabilidade dos traços de personalidade, eles têm potencial para predizer a reincidência, reforçando a necessidade de intervenções de longo prazo voltadas à promoção de um trânsito mais seguro — como prazos menores de validade da CNH, reavaliações psicológicas e a participação obrigatória em programas de intervenção no processo de renovação. Portanto, dados dessa natureza têm o potencial de fortalecer a legislação e contribuir para reduzir o impacto de comportamentos como dirigir alcoolizado”, afirma o pesquisador Renan Monteiro.

O estudo foi realizado em parceria com pesquisadores da University College Cork, na Irlanda, e contou com o apoio de bolsas de produtividade em pesquisa do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e de mestrado da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). Para viabilizar a análise de múltiplos traços de personalidade, foram aplicadas diversas escalas psicológicas, adaptadas em versões reduzidas para garantir a participação dos voluntários.

Na pesquisa já publicada, foram analisados os modelos da Tríade Sombria, dos Cinco Grandes Fatores e de Impulsividade e Busca de Sensações. Para os próximos estudos, os pesquisadores pretendem incluir outros referenciais – como a Tétrade Sombria (psicopatia,  narcisismo, maquiavelismo e sadismo), o modelo HEXACO (seis dimensões da personalidade) e o fator D (tendência de priorizar interesses próprios em detrimento dos outros) – com o objetivo de ampliar a compreensão sobre os traços psicológicos ligados a comportamentos de risco no trânsito.

A pesquisa completa foi publicada no periódico internacional Traffic Injury Prevention e está disponível aqui.

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Texto: Lucas Andrade
Edição: Hugo Bispo
Foto: Freepik
Ascom/UFPB